O saxofone
Tropeçamos em pedras como quem respira fundo
Bebemos os sonhos que escorrem pela ampulheta da raiva
E...como quem guarda poemas em gavetas
Absorvemos o vinho que alegra o mundo
Mas nunca somos nós...
Nunca damos vazão ao lento desabar da tristeza
E se as pedras ganham vida quando lá gravamos o nosso nome
E se pensamos que o mar é um milagre de azul e cinza
É porque esperamos que algo se erga dentro de nós
É porque as palavras são pastosas
Colam-se a nós como cobaias da felicidade
Com as palavras amamos violentamente o cerne das coisas
No seu vazio construímos muros e arcadas
Facas alquímicas...fomes
Podemos proibir o sangue de correr
Podemos proibir o vento de soprar..somos sonhos
Vestimos um xaile negro ...desatamos um nó
Desafiamos tudo o que não faz sentido
Em cada noite...minguamos...
Em cada tigela sorvemos a sopa do medo
E também precisamos desatar as correntes do silêncio...gritar...
Precisamos conhecer o ventre das trevas
Trespassar caminhos...demolir desterros
Ao longe acende-se uma vela
Como se fosse uma cicatriz na escuridão
Mas não nos alumia...esconde-se...
Transforma-se em choro de barco à deriva
Enquanto nós...fechamos os olhos
Escutamos um saxofone...
E somos o jazz da vida..