Seres alados
Estranhos seres alados guardam a entrada da minha sombra
Brilham como mãos onde percorro as saudades
E há um ciclo na vida que não posso saber
Um sonho dentro de outro sonho
Até que tudo acaba dentro de um homem indecifrável
Seguindo por aí...
A minha silhueta percorre a imobilidade de um gesto resplandecente
Ao meu corpo agarra-se a irrealidade
Como fugazes grãos de areia
A luz brilha como se fosse um fragmento de mim
Estremeço com a fuga da minha alma para o fundo do mar.
É noite...
O meu coração apunhala as árvores onde se deita a agonia das visões
Já não toca em mim o teu grito de espanto
Peço à cidade que grite por ti
E que a aragem nua dos nossos escombros
Povoe o firmamento com risos de esperança-
Vem...
Vem apanhar comigo a desolação da cera fria
Entornada do cálice onde arderam as nossas nostalgias
Os anos..
São bem o exemplo de que somos apenas peregrinos
Vivendo como a pele enrugada dos cardos-
Cubro-te com a minha aragem...
Infiltro-me nos becos mais esconsos.
Bebo um café e sento-me...imóvel
Espero-te..espero-te como um pássaro cego
Por um amor sem fruto nem flor
Não te agarres ao silêncio..foge da tempestade
Recolhe toda a alegria
Que possam conter as esbeltas flores da alma
Recordo-te que posso ser a última ave
O último descendente dos girassóis..
Ou o brilho que nasce no fundo do poço.
Dentro de mim há um acendimento vegetal
Uma agonia que dispo ao anoitecer
Uma vã esperança de não querer ser sério
Agarro-me ao firmamento...calo a tempestade..
Açoito a areia que cai sobre mim em bátegas
Desnudo-me perante a loucura da folhagem
Tudo em mim é um ai e um desprendimento
Um olhar nascido da profunda terra negra
Algures..recolho o cansaço inesperado da alma
Cubro os olhos como um Deus aflito
Despeço-me do silêncio do meu trono insatisfeito
Parto levando apenas as mãos
Com essas mãos que escavam gestos
E escrevem nos versos nos sítios mais esconsos
Túmulos de palavras que só eu conheço
Que tudo gira no meu interior
Como um dardo que percorre a nascente da vida...
E desagua na imobilidade da esperança...