Tarde perdida
Na amnésia da noite está o espaço
Que medeia entre o teu caos e o meu deslumbramento
Na tua voz se deitam os momentos
Em que os sonhos tecem delícias.
O vento vibra
Alagando todos os sentimentos com uma sede de areia
Como se translúcidas veias
Se erguessem na pele ensonada do tempo.
Aqui está a cavidade
Onde o coração se derrete em flocos de sabor amargo
Ali vai a suave seda que toca a parte íntima da pele
E rodopiamos
Rodopiamos num bailado feito com a geometria dos silêncios.
Descobrimos recônditos seres
Que se escondem dentro do nosso olhar
Sabemos agora que caiamos a nossa vida
Com a brancura dos moinhos de vento
Esse vento que sopra
Na nossa enfunação de almas que ondeiam na tarde de agonia.
Bandos de pássaros saltitam na vegetação do estio
São pássaros entrelaçados na lentidão de nós
Pássaros complexos...livres do espaço
E das pontes quebradiças das coisas que não queremos
E nós... em pontas dos pés
Erguemos o nosso ballet gelado
Como convém àqueles que se libertam
Das estátuas volúveis e absortas
Que passam o tempo acenando a quem passa
E que são inúteis como sombras na água.
Tentaculares memórias apócrifas
Ocupam o espaço demolido da alma
Ao mesmo tempo
Que tomamos minuciosos banhos de corações assombrados
E arejamos o sono
Cobrindo o final da tarde
Com uma moldura presa na parte hesitante do dia
E olhamos a profundidade das asas das borboletas
Que vagueiam pela nossa vela acesa
Como sonâmbulas
Ou como fantasias de uma tarde perdida...