Teias
Teço a minha teia. A Terra percorre o imperturbável espaço. Os dias são pequenas variações cromáticas. E eu percorro a minha indiferença como quem se desfaz de um fato púrpura. Como quem despe uma plumagem que já não lhe serve. Como quem muda de alma e não de pele.
Percorro as minhas estradas esburacadas. Construo cenários de pássaros taciturnos. E gosto da lareira. É lá que queimo a minha solidão. Enquanto apoio os pés num sarcástico tronco de cedro. O relógio faz o seu aflitivo tic-tac. A luz débil da tarde repousa sobre o livro que abandonei na cadeira de baloiço. E eu...vingo-me das horas...a procurar perceber o mundo que desconheço. Gasto as minhas energias. Rego as hortências azul-cobalto. Mas não faço qualquer esforço para me arrepender das coisas que não faço.
Os pardais debicam os insectos que vivem nas flores já murchas....quase secas. Espreito-os por detrás da janela como repara no mundo. E se na igreja os sinos me lembram das horas...sento-me na varanda e mastigo as minhas memórias.