Um corpo que canta
Quando eu souber que é na minha pele
Que descansa o frio que me envolve
Que os meus pés pisam o fundo das sombras
E os morros do mar
Que o luar vibra com a tristeza dos pássaros
Então...espreitarei o fundo de mim...
Perante o cansaço das flores
Tecerei longos mantos com os débeis fios da aurora
Cobrirei o meu esquecimento das coisas
Com a bruma espessa da infância
Vestirei a minha vigília
Com a chama de um tempo apagado
E por entre o espaço e o cansaço que me resta
Viverei...como um império de sorridentes ventos
Como uma dança
Que volteia na imobilidade das chamas
Queimando os dias...
Queimando as pontes que não posso atravessar
Queimando o mundo e o convés dos instantes
Que se prendem a mim como faróis
E são esboços de linhas rectas...
Ocasos de silêncios rolam pela superfície
Das prisões que me cercam
Que eu atei a mim...como sombras...
Como barcos...como nós que não desato
Como mirantes de vidas passageiras
Que desaguam em rios de águas desconhecidas
Náufrago de silêncios....
Brancura de deuses assentes em estepes desertas
Desfaço-me em grãos de areia
Que rolam pela minha ansiedade
Como sonhos..como crinas...
Como sepulturas de almas envoltas
Em finas asas de cristal
Que assim vou....
De névoa em névoa...de mundo em mundo
Como um mistério colado
Aos claustros loucos das catedrais
Como vibrantes e voláteis desejos de eternidade
Como marcas de passos deixados na planície
Melancolicamente branca
Onde vibro...
No fascínio de ser indeterminadamente...
Um corpo que canta...
Ao infinito...