Um dia..vestirás a vida
Queres recordar a seiva da juventude e devorar a claridade do tempo
Mas os teus olhos são cegos para o estremecimento das coisas
Queres perseguir os astros ...e como se fosses um camaleão feito de luzes...
Ascender às raízes das aves e ao profundo medo dos lábios
Um dia..vestirás a vida com asas sibilinas..
Feitas com a penugem de pássaros enfeitiçados
Serás o olhar que nada deseja..o desamparo dos deuses...o caminhar das estradas
Aproxima-se a manhã..e tudo rebenta numa seiva de mares...
Todos os caminhos ouvem os teus fogos..
As tuas raízes afundam-se numa letargia de ossos foscos..
Sabes que no silêncio pestanejam injúrias..tu próprio adquiriste as injúrias só para ti
Como se fosse um sábado onde a cinza sepulta as mãos...
E sobes por ti como se não estivesses vivo..queres glorificar em ti todas as coisas
Alimentas-te de avanços e de memórias..de fragores..de luzes artificiais
Misturas-te com a pele e adormeces como um espectro...
Persegues o mineral da existência...a seiva que escorre dos abismos...
Talvez até nem sejas tu a respirar o medo das ruas..ou a loucura da inconsciência
Talvez até saibas que o destino espantou os céus...
Mas a solidão das águas..cresce como um desabafo...
Como uma estrela que decora o escuro...
E que se funde nos teus sólidos passos meio desertos
Nas tuas mãos guardas a transformação das coisas..as vísceras da idade
Talvez consigas adiar o movimento do fumo..mas os teus dedos permanecerão
Como pão fortificado pelo absoluto nada...