Uma noite sem telhados para se esconder..
Nunca saberei que impulso me impele para as ruas arruinadas
Nem que sol me aquece as linhas do rosto
É tudo tão raro...tudo tão inútil...que mesmo que os insectos estremeçam nos flores
Tudo será um excessivo gesto...um entoar de um cântico desnecessário ...
Um período de tempo sem pensamentos ...
Nunca saberei porque razão os ciprestes emprestam à paisagem uma cor fúnebre
Marcando nos muros uma sombra excessiva...
Imposta por uma melancolia sem tréguas...
Entre mim e as coisas há sempre algo que estala...que canta e se parte...naturalmente
Enquanto cruzo os campos...piso ervas que se queixam dos meus passos...
E não volto a mim..sigo absorto por tanta beleza que me passa pela cara...
Nunca saberei que sangue empapou os ninhos das aves...nem a barriga das luzes...
Nem mesmo que todo o céu se cubra de gerânios brancos....
Nunca saberei o que sente um boneco descarnado...
Ou uma cama desfeita cujos lençóis dourados reclamam por mais calor
Nunca saberei qual é a singularidade melodiosa de uma rua ladeada por jazigos
De uma noite sem telhados para se esconder...de um latejar que empalidece os olhos...
Nunca saberei o que sente um candeeiro fatigado por tantas noites em branco
Por tantas incertezas...por tanta gente que passa de olhos curvados sobre a calçada...
Há tanto sangue...tanta carne...tanta lágrima apoquentada...
Há tanto para saber...que até as estrelas se aconchegam em eternos mistérios...
E não contam nada...não dizem nada...mas...
Esmagam-nos com promessas que descem na chuva...e nos empapam o espírito...
E nos deixam como casas despejadas de luz...
Vazias e encantadoras como palavras incumpridas...que nos estilhaçam os dias...
E nos fazem crer que a noite é o triunfo das nascentes...
De onde brota a água que nos lava o sangue...e nos refresca os olhos...
E nos faz acreditar que o azul é o céu inflamado de mar....
Nesse mar onde a nossa respiração balança suspensa numa bóia...
Que um dia nos libertará dançando e elevando-se...
Como se fôssemos uma espécie de poeira ofegante!