Voo silencioso
Abri os meus olhos
E vi a irresistível atracção da beleza trágica
Inflamada por um tempo sem essência
Que se faz passar por uma recordação
Absurdamente maravilhosa e clarividente
Contemplo esse tempo
Com o coração aberto sobre os meus olhos cegos
Que a si mesmo se torturam
Com a recordação impossível de um amor feito de febre
Já não me posso fazer passar por mim
Já não posso amaldiçoar as alegrias
Nem as penas...nem as sombras
Já não distingo o tempo
Em que o sono me surgia
Como um cume submerso em nevoeiro
Tão cruel e verdadeiro
E ainda maior e mais fechado que uma sombria água
Ainda maior e mais profundo
Que uma paisagem que floresce
Apenas para os olhos despertos
E para os matizes triunfantes da volúpia
E mais que um sonho cintilante
E mais que uma terrível sombra
Que num chão de carmim
Segue fechada ao inebriante amor
E mais que uma sonoridade eloquente
Que multiplica os sentidos em alvas doçuras
E mais que horizontes de luz e verde
Banhados pelas sonoras cascatas de serenidade
Em que os enormes mistérios da solidão se vingam
Nas flores que se desfolham
Em caprichosos perfumes afrodisíacos
Como se fossem violinos entoando melodias
Que encantam o nosso voo silencioso pelos bosques do céu.